A era moderna surgiu à sombra dos ideais conquistados pela Revolução Francesa. O crescimento das repúblicas e das democracias liberais ao redor do mundo, o desenvolvimento das ideologias modernas, das ciências e das artes, a invenção da guerra total, e, no limite, o homem como personagem central nesse cenário tiveram o seu nascimento durante a revolução.
No campo da arte, muitos artistas se dedicam, nos dias de hoje, à pesquisa acerca dos desdobramentos do modernismo. Há ainda os que preferem investigar as raízes filosóficas, éticas, estéticas e políticas que conduziram, ainda no século XVI, ao surgimento da era moderna e ao pleno estabelecimento e expansão dos ideais liberais em todos os âmbitos da cultura ocidental até os dias de hoje. Tal procedimento investigatório é evidente na exposição U=RI proposta pelos jovens artistas Guilherme Peters e Henrique César.
O título da exposição faz referência à fórmula usada na física para medição da tensão elétrica [voltagem] entre dois pontos, e, no caso dessa exposição, revela vários dos procedimentos exercidos pelos artistas na conceitualização, elaboração e materialização de suas obras. Isso ocorre, na forma como os três artistas optam por representar o corpo humano.
No caso da série de autorretratos “Enxertos”, “Antenas” e “Terra”, de Henrique César, o homem, suas necessidades físicas, curiosidades, originalidade e domínio sobre as forças da natureza é o centro da representação, e, portanto, do mundo, aparecendo turbinado por artificialismos técnicos sugeridos por antenas, num misto entre homem e máquina.
No caso de Guilherme Peters, a repetição funciona como ferramenta para evidenciar a eterna busca do homem pela superação dos limites físicos e intelectuais do corpo. Na performance “Estudante” [2012], que Peters realizará durante A mostra, a repetição ad infinitum de um único movimento, aponta, segundo o próprio artista, para a ideia de fracasso eminente a todo processo de conhecimento. Na performance, o artista tenta repetidas vezes finalizar um desenho de observação que, entretanto, depende da ação física de suspender, por meio de um sistema de roldanas e cabos, conectados como próteses ao seu corpo, livros relacionados à história da arte.
Em 2010, Guilherme Peters encarnou um dos principais personagens da história moderna no vídeo “Robespierre e a tentativa de retomar a revolução”. Na instalação, o artista tece um comentário sobre a origem do movimento republicano, que aponta para a impossibilidade da utopia revolucionária prosperar num mundo em que tarefas simples e repetitivas provocam “vertigem”.
Em U=RI, o artista dá continuidade a essa pesquisa apresentando um conjunto de trabalhos diretamente relacionados ao tema, como a instalação “Retrato de Robespierre”, na qual uma imagem do revolucionário francês é estampada por meio de um processo de oxidação ininterrupto, que transformará a imagem.
Processo químico semelhante é utilizado por Peters nas instalações “Autodestruição dos direitos humanos”, “Terra Santa” e “Máquina para evocar o espírito de Joseph Beuys através de sua imagem”. Nas duas primeiras obras, o processo de oxidação das placas de ferro é constante e acarretará a completa transformação da imagem do século XVIII da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, e, na segunda, de uma passagem retirada do Torá que remete à terra prometida, ou, nos dias de hoje, à Palestina. Já em “Máquina para evocar o espírito de Joseph Beuys através de sua imagem”, que faz referência à performance criada por Peters, em 2009, o retrato de Beuys, ao lado de um do próprio artista foram estampados sobre uma placa de cobre [Beuys] e outra de ferro [Peters]. Submersos em um aquário, as placas sofrerão um processo de eletrólise, que fará com que o retrato de Peters, estampado sobre placa de ferro, incorpore partículas de cobre expelidas da placa Beuys.
O obscurantismo que a era moderna tentou combater por meio do conhecimento cientifico, aparece na série “Catacumbas” de Henrique César. Nos desenhos, o artista apresenta imagens de catacumbas subterrâneas localizadas nas cidades de São Paulo e Paris, ao lado do vídeo “Endoscopia”, no qual uma câmera endoscópica escrutina o interior de um esqueleto, além do políptico “Radiografia de Parede”. Nesse último, César apresenta o que há sob o reboco de paredes, revelando seu interesse cientifico acerca daquilo que está sob as calçadas, sob a pele ou mesmo sob a fachada dos muros.
Procedimento de escrutino similar aparece no vídeo “Tentativa de aspirar o grande labirinto”, no qual Peters criou, por meio de ferramentas de edição 3D, um passeio virtual dentro de um dos “Metasquemas” de Helio Oiticica. Na obra, Peters se apropria ainda do texto “Brasil Diarréia”, escrito por Oiticica em 1970, que aponta para a diluição dos elementos construtivos brasileiros.
A trabalhos como “Catacumbas”, “Endoscopia” e “Políptico Radiografia de Parede”, César contrapõe o seu “Tratado Anagógico”. O desenho com 1,80 m. de altura, similar a uma formula química gigante, pretende aferir a ferramentas técnicas cujo papel é bastante claro e especifico no campo da ciência, significações místicas e obscurantistas.
Se por um lado César escolhe o termo tratado para criticar a contra corrente que insiste em colocar o conhecimento cientifico em xeque, Peters prefere o formato de diagramas, esquemas, gráficos e circuitos, que, na história do conhecimento, auxiliaram o homem a organizar o conhecimento e asseguraram a base para a compreensão futura de suas aquisições, para abordar questões subjetivas. É o que ocorre em “Projeto para um grande resistor” e “Projeto para grande carburador”. No primeiro, Peters utilizou páginas do Livro Vermelho de Mao Tsé-Tung como papel de fundo para um grande desenho que imita um circuito elétrico, e, no segundo, o desenho para o projeto de um grande carburador sobrepõe notas sobre a Revolução Francesa.
A era moderna surgiu à sombra dos ideais conquistados pela Revolução Francesa. O crescimento das repúblicas e das democracias liberais ao redor do mundo, o desenvolvimento das ideologias modernas, das ciências e das artes, a invenção da guerra total, e, no limite, o homem como personagem central nesse cenário tiveram o seu nascimento durante a revolução.
No campo da arte, muitos artistas se dedicam, nos dias de hoje, à pesquisa acerca dos desdobramentos do modernismo. Há ainda os que preferem investigar as raízes filosóficas, éticas, estéticas e políticas que conduziram, ainda no século XVI, ao surgimento da era moderna e ao pleno estabelecimento e expansão dos ideais liberais em todos os âmbitos da cultura ocidental até os dias de hoje. Tal procedimento investigatório é evidente na exposição U=RI proposta pelos jovens artistas Guilherme Peters e Henrique César.
O título da exposição faz referência à fórmula usada na física para medição da tensão elétrica [voltagem] entre dois pontos, e, no caso dessa exposição, revela vários dos procedimentos exercidos pelos artistas na conceitualização, elaboração e materialização de suas obras. Isso ocorre, na forma como os três artistas optam por representar o corpo humano.
No caso da série de autorretratos “Enxertos”, “Antenas” e “Terra”, de Henrique César, o homem, suas necessidades físicas, curiosidades, originalidade e domínio sobre as forças da natureza é o centro da representação, e, portanto, do mundo, aparecendo turbinado por artificialismos técnicos sugeridos por antenas, num misto entre homem e máquina.
No caso de Guilherme Peters, a repetição funciona como ferramenta para evidenciar a eterna busca do homem pela superação dos limites físicos e intelectuais do corpo. Na performance “Estudante” [2012], que Peters realizará durante A mostra, a repetição ad infinitum de um único movimento, aponta, segundo o próprio artista, para a ideia de fracasso eminente a todo processo de conhecimento. Na performance, o artista tenta repetidas vezes finalizar um desenho de observação que, entretanto, depende da ação física de suspender, por meio de um sistema de roldanas e cabos, conectados como próteses ao seu corpo, livros relacionados à história da arte.
Em 2010, Guilherme Peters encarnou um dos principais personagens da história moderna no vídeo “Robespierre e a tentativa de retomar a revolução”. Na instalação, o artista tece um comentário sobre a origem do movimento republicano, que aponta para a impossibilidade da utopia revolucionária prosperar num mundo em que tarefas simples e repetitivas provocam “vertigem”.
Em U=RI, o artista dá continuidade a essa pesquisa apresentando um conjunto de trabalhos diretamente relacionados ao tema, como a instalação “Retrato de Robespierre”, na qual uma imagem do revolucionário francês é estampada por meio de um processo de oxidação ininterrupto, que transformará a imagem.
Processo químico semelhante é utilizado por Peters nas instalações “Autodestruição dos direitos humanos”, “Terra Santa” e “Máquina para evocar o espírito de Joseph Beuys através de sua imagem”. Nas duas primeiras obras, o processo de oxidação das placas de ferro é constante e acarretará a completa transformação da imagem do século XVIII da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, e, na segunda, de uma passagem retirada do Torá que remete à terra prometida, ou, nos dias de hoje, à Palestina. Já em “Máquina para evocar o espírito de Joseph Beuys através de sua imagem”, que faz referência à performance criada por Peters, em 2009, o retrato de Beuys, ao lado de um do próprio artista foram estampados sobre uma placa de cobre [Beuys] e outra de ferro [Peters]. Submersos em um aquário, as placas sofrerão um processo de eletrólise, que fará com que o retrato de Peters, estampado sobre placa de ferro, incorpore partículas de cobre expelidas da placa Beuys.
O obscurantismo que a era moderna tentou combater por meio do conhecimento cientifico, aparece na série “Catacumbas” de Henrique César. Nos desenhos, o artista apresenta imagens de catacumbas subterrâneas localizadas nas cidades de São Paulo e Paris, ao lado do vídeo “Endoscopia”, no qual uma câmera endoscópica escrutina o interior de um esqueleto, além do políptico “Radiografia de Parede”. Nesse último, César apresenta o que há sob o reboco de paredes, revelando seu interesse cientifico acerca daquilo que está sob as calçadas, sob a pele ou mesmo sob a fachada dos muros.
Procedimento de escrutino similar aparece no vídeo “Tentativa de aspirar o grande labirinto”, no qual Peters criou, por meio de ferramentas de edição 3D, um passeio virtual dentro de um dos “Metasquemas” de Helio Oiticica. Na obra, Peters se apropria ainda do texto “Brasil Diarréia”, escrito por Oiticica em 1970, que aponta para a diluição dos elementos construtivos brasileiros.
A trabalhos como “Catacumbas”, “Endoscopia” e “Políptico Radiografia de Parede”, César contrapõe o seu “Tratado Anagógico”. O desenho com 1,80 m. de altura, similar a uma formula química gigante, pretende aferir a ferramentas técnicas cujo papel é bastante claro e especifico no campo da ciência, significações místicas e obscurantistas.
Se por um lado César escolhe o termo tratado para criticar a contra corrente que insiste em colocar o conhecimento cientifico em xeque, Peters prefere o formato de diagramas, esquemas, gráficos e circuitos, que, na história do conhecimento, auxiliaram o homem a organizar o conhecimento e asseguraram a base para a compreensão futura de suas aquisições, para abordar questões subjetivas. É o que ocorre em “Projeto para um grande resistor” e “Projeto para grande carburador”. No primeiro, Peters utilizou páginas do Livro Vermelho de Mao Tsé-Tung como papel de fundo para um grande desenho que imita um circuito elétrico, e, no segundo, o desenho para o projeto de um grande carburador sobrepõe notas sobre a Revolução Francesa.